Entre as promessas que se tornaram obrigações em 2010, inclui-se a de fazer exercícios físicos com constância, visto que minha saúde abrira o bico no início do ano citado. Lá fui eu fazer matrícula na ACM, num plano sem musculação, mas com direito à piscina - o que basta para minha alegria.
Fazia muito tempo que eu não nadava nem praticava hidroginástica. Mas fazia mais tempo ainda que eu não usava um vestiário masculino. Parece que desabituei.
Semana passada, esqueci de levar toalha e chinelo. Emprestaram-me o chinelo, mas tive de alugar uma toalha na rouparia, preço simbólico. Era uma toalha branca. Fiz a aula de hidro, relaxei, flutuei, desencanei de tudo. Voltei para o vestiário, abri o armário, peguei a malfadada toalha branca, fui aos chuveiros, pendurei-a num gancho, e aproveitei o prazer indescritível da ducha quente no corpo cansado. Mas na volta...
Na volta reparei que havia uma toalha branca ao lado da minha toalha branca - ou melhor, da toalha branca que eu tinha de devolver na rouparia. Fiquei olhando para elas uns 30 segundos, hesitando, e as pessoas devem ter pensado quão grande, profunda e enigmática reflexão estava eu fazendo sobre a natureza e a filosofia das toalhas. Finalmente, cheguei ao ápice do enlevo com uma conclusão estarrecedora: eu não sabia qual das duas era a minha. Situação incômoda, mas que não poderia conduzir à imobilidade; afinal, eu teria de devolver alguma coisa para a instituição.
Com uma vergonha imensa, perguntei aos que ainda estavam no chuveiro quem trouxera uma toalha branca. Manifestou-se um senhor, que gentilmente saiu do quente da água para desfazer o nó perceptivo em que eu me enredara. Mas a questão era mais complicada do que parecia, muito mais, porque rapidamente ele caiu no mesmo estado contemplativo diante das toalhas penduradas, sustentando a concentração por um tempo igualmente longo, até admitir que também não conseguia identificar qual era a minha e qual era a dele.
Naquele momento eu fiquei aliviado em saber que não sou o único distraído do mundo. Escolhi uma delas, e disse ao senhor que a utilizaria e devolveria ao roupeiro, esse sim, com instrumental intelectual suficiente para desfazer o engano em que nos embananáramos. Disse ainda que retornaria para avisar.
Não sou uma pessoa melindrosa, mas confesso ter torcido para acertar dessa vez, porque não me parecia das melhores e mais recomendadas atitudes do mundo usar coisas de pessoas que não conheço. Dei sorte, deu tudo certo. Quando estava indo embora, o roupeiro mostrou a marquinha da ACM perto da etiqueta, suficiente para esclarecer qualquer dúvida a respeito da propriedade daquele item. Voltei ao vestiário, avisei o senhor, e fui para casa.
Dei boas risadas pensando no caso. Coisa de quem tem cabeça na Lua. Só eu mesmo.
Mas, se eu achava que tomaria a linha depois dessa, muito me enganava a meu respeito. Pois não é que aprontei outra? Voltei da aula da hidroginástica e fui direto ao armário onde deixara as minhas coisas, o 183. Peguei a chavezinha e fui abrir o cadeado, mas não consegui. Então pensei: - Bobão, é o 182. Mas ele estava vazio. Fui ao 184, e o cadeado era de outra marca. Pensei então: - Acho que guardei minhas coisas na outra fila de armários. Mas fiquei constrangido de testar a chave em todos eles, porque havia pessoas se trocando. Nesse momento, caí naquele mesmo estado de profunda reflexão filosófica, desta vez a respeito de armários e cadeados, e disse para mim mesmo, com toda a franqueza e dignidade do mundo: - Não lembro onde coloquei minhas coisas.
Isso deve ter ficado tão explícito na minha cara de paisagem que um dos senhores perguntou-me se eu precisva de ajuda. Contei meu drama, e ele riu, como mais tarde eu mesmo faria ao pensar naquela embaraçosa situação. As pessoas me olhavam com ar engraçado. Eu não sabia o que fazer no meio daquele monte de gente; estava realmente envergonhado.
E então, surgiu a personagem que poderia me tirar daquela crise, o rapaz que cuida do vestiário, e que devia estar acostumado com coisas do tipo. Ele me pediu a chave e foi testando armário por armário, coisa que não pdoeria ser feita por mim sem irritar os outros usuários. Eu achava que o meu era um armário perto da porta, de numeração menor, o que o obrigou a passar por três fileiras diferentes com a chavezinha testando a compatibilidade dos cadeados sem sucesso. Mas eu estava absurdamente enganado, o meu era lá do outro lado. Qual não foi meu alívio ao vê-lo abrindo o cadeado do 202, beeeeeem longe de onde eu pensava estarem minhas coisas. Agradeci meio sem jeito, peguei o que ali guardara, me vesti e voltei para casas com mais uma piada sobre minha cabeça de vento. E não duvido de que ainda venham outras. Fazer o quê?
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