Nas últimas semanas, vingou uma onda de recriminações a Tiger Woods, por conta de seus casos extraconjugais. Tenho uma postura radical a respeito desse tipo de polêmica, postura que é baseada, inclusive, em minha experiência marital. Em poucas palavras: não recrimino Tiger em nada a esse respeito. Nem a ele, nem a ninguém.
O que penso é o seguinte: houve agressividade, rispidez, mágoa, adultério, deslealdade, decepção, incompatibilidade de gênios ou descompasso sexual? Problema do casal. Ponto final. A pessoa resolve com seu parceiro. Acabou. Não interessa e não diz respeito a mais ninguém. Isso não é notícia, não é do interesse público, não tem nada a ver com o direito à informação. Uma coisa é olhar para uma relação como parte interessada (amigo, família, padrinho) e tentar entender que realmente está acontecendo. Outra coisa é massacrar as pessoas com bisbilhotices, procurando sinais que servem tão somente a especulações e julgamentos descabidos.
A verdade é que ninguém sabe o que uma pessoa vive ou viveu em seu relacionamento amoroso, e isso não pode ser simplesmente deduzido a partir dos sinais exteriores. Houve adultério? Como posso saber se isso é um acordo a dois, uma vingança, uma escapada, ou uma profunda insatisfação interior? Como posso saber se isso não é doença, vício em sexo, incapacidade de lidar com a estabilidade? Como posso julgar o indivíduo se desconheço sua psicologia (e não se engane: o que as pessoas falam ou fazem em público NÃO É o que elas são em seu íntimo, por mais que queiramos nos iludir)? Que afirmações posso fazer acerca da intimidade de um casal com o qual não partilhei nada a não ser fotos e fofocas? Que direito tenho de avaliar um comportamento de um indivíduo quando desconheço os jogos de poder, sedução, chantagem, assédio e pressão psicológica a que ele possa ter sido submetido? Indo até mais longe: por que é necessário justificar, ou absolver, ou condenar, uma atitude da vida pessoal de alguém que não tem nenhuma relação com minha vida pessoal? Tenho certeza de que, se as pessoas soubessem um décimo do que acontece nos relacionamentos, renegariam no mínimo metade das afirmações que fizeram sobre eles.
Mas a questão é outra: as pessoas não têm de saber dessas coisas. Deixem Tiger em paz! Ele tem de jogar golfe, e nisso ele é fantástico. O resto não interessa. Não diz respeito a ninguém além dele e da mulher. Não somos nós que temos de achar certo ou errado o que ele fez; é ele, só ele. Nós, que gritamos, mentimos, traímos, forjamos cenas, omitimos verdades, inventamos, que fazemos de tudo isso um pouco, nós não gostaríamos de nos ver resumidos a esses aspectos que podemos, sem muito esforço, apontar em nosso comportamento. As coisas que fiz de errado na minha vida, ou mesmo no meu casamento, não me definem, de maneira alguma. Fui capaz de superar muitas delas, sou capaz de conviver com outras tantas, e qualquer um que procurasse projetar meu caráter a partir das falhas que apresenta erraria feio. Da mesma forma, penso que é uma hipocrisia tirar patrocínios do cara, cortar publicidades, cancelar entrevistas. Quer dizer que o homem que teve outras mulheres não tem coração nenhum? Por que as entidades assistenciais não devolvem o dinheiro que ele deu? Por que os fãs não devolvem os autógrafos e renegam todo o carinho que o golfista teve com eles no decorrer desses anos todos?
É totalmente ridículo, na era pós-revolução sexual em que vivemos, reduzir um sujeito àquilo que instâncias hipócritas definiram como sendo sua imagem pública. Acho que deve doer demais reconhecer que os indivíduos não cabem nos rótulos em que se quer colocá-los. Quando se trata de relacionamentos e seus problemas, na imensa maioria das vezes, quem fala a respeito não faz a mínima ideia do que está acontecendo, e poderia perfeitamente abster-se de emitir julgamentos. Até porque, para o universo das experiências amorosas, desregradas e anticonvencionais por excelência, esses julgamentos não fazem a menor diferença.
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