Escrever um texto sobre o peso do presidente Lula na eleição de 2010 seria chover no molhado. Lula foi a eleição. Mesmo considerando todos os méritos de Dilma Roussef, e não são poucos, sem o apoio e a participação do presidente na campanha ela não teria a mínima chance contra José Serra. Dilma não era conhecida, não era uma figura popular e, como Serra, não transparecia aquele carisma que é a marca inegável do atual presidente.
A alguns dias do primeiro turno, Mônica Waldvogel (vídeo editado aqui, o não editado é encontrável também) entrevistou dois cientistas políticos conceituados, perguntando a eles quais seriam as estratégias da candidatura Serra para evitar a derrota. Eles não sabiam dizer, e consideravam improvável um resultado que não fosse a vitória de Dilma. Mônica chegou a se irritar com o que afirmavam os especialistas, mas eles faziam, ali, seu papel de intelectuais: analisando os fatos, a verdade é que o apoio de Lula definiria a eleição. Mesmo nos momentos iniciais do segundo turno, quando o jogo parecia ter embolado, não houve nenhuma diferença entre Serra e Dilma que indicasse qualquer outro resultado que não a vitória da ministra.
Quem deu a resposta que Mônica queria foi a equipe de campanha de Serra. Era preciso atacar Dilma, e tomar cuidado para não atacar Lula. A tática funcionou. A figura de Dilma, descolada da de Lula, passou a ser sistematicamente atacada no ethos, no caráter, na essência. O golpe foi forte e baixo, como sabemos, e, associado ao crescimento da não-atacada Marina, construiu as condições para o segundo turno.
Mas no segundo turno, Lula engajou-se ainda mais, ganhando as ruas com sua candidata, atacando Serra no caso da bolinha de papel, mostrando-se o grande fiador de sua criação. Serra ficou de mãos atadas, pois não poderia apresentar-se como adversário de uma figura com tamanha aprovação popular.
A associação de Dilma com a continuidade da gestão de Lula era tão evidente que a vitória da ex-ministra foi concomitante ao atingimento dos mais altos índices de aprovação por parte de Lula. Expondo-se publicamente, aparecendo na campanha, Lula se tornou ainda mais popular.
É impossível não considerar Lula como o grande vitorioso da eleição. Fernando Henrique Cardoso conseguiu duas vitórias contra Lula, mas Serra fez de tudo para se desvincular de sua imagem quando disputou as eleições pelo PSDB. FHC não tinha condições políticas de fazer seu sucessor, e isso era decorrência dos problemas de administração no seu segundo mandato. Lula, pelo contrário, fez sua sucessora, e fez isso com alguém que não tinha, em 2010, nem um décimo da popularidade que Serra já tinha em 2002.
Se quisesse, Lula conseguiria um terceiro mandato. FHC mudou a Constituição e fez uma série de desastrosas negociações para conseguir seu segundo mandato, que acabou manchado pelos compromissos políticos assumidos para obtê-lo. Lula, ao contrário, tinha o trabalho de negar que pensava em mudar a Constituição e candidatar-se mais uma vez para uma vitória certa, possibilidade que era aventada por pesquisas que indicavam que a maior parte da população tinha esse desejo. Inteligentemente, e com a preocupação de consolidar as instituições democráticas, Lula preferiu o caminho da construção paulatina de um sucessor. Os tucanos não acreditavam nessa aposta, e declararam, várias vezes, que Dilma não poderia vencer um político já tão conhecido e tarimbado como José Serra. Dilma não poderia, evidentemente, mas Lula pode. E venceu.
Esta foi a primeira eleição direta, desde o fim do regime militar, em que o nome de Lula não aparecia na cédula. Mas, depois das derrotas para Collor e FHC, e das vitórias sobre Alckmin e Serra, parece que a candidatura Lula se tornou permanente, vitalícia, sendo apresentada como dele mesmo ou como de um representante de sua forma de governar. Em 2014, saberemos se essa perspectiva se consolida, ou se o povo esquecerá os 87% de aprovação de seu líder mais carismático.
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