Na comunidade "Brasil" do orkut, em dezembro de 2009, um gaiato resolveu comemorar a imensa dianteira que o candidato José Serra tinha nas pesquisas. A essa altura, o tucano pontuava 44%, adjetivados como "inacreditáveis" pelo membro que abrira o tópico.
Quando a eleição se definiu, no segundo turno, em novembro de 2010, Dilma cravara 56% nos votos válidos, contra 44% de Serra. Um petista sacana ou espirituoso deu um "up" no tópico de quase um ano antes, brincando com os números que apareciam nas pesquisas. Gozador, ele encarnava no internauta que saudara os percentuais de Serra, chamando-o de profeta e elogiando a capacidade de acertar índices com tanta antecedência.
O episódio citado serve para mostrar uma das características que fizeram desta uma eleição singular. A verdade é que Serra não acreditou em Dilma, o PSDB não levou a candidatura dela a sério e os gurus políticos do partido erraram monstruosamente ao pensar (e por vezes declarar sem nenhum pudor) que a boa avaliação do presidente Lula não transferiria votos. Faltou aquele bom senso básico de entender que uma eleição só "esquenta" quando os candidatos se definem e passam a ser conhecidos dos eleitores. E mais: faltou respeitar Dilma e o PT. Em certo momento, parecia que os marqueteiros tucanos tinham nos bolsos e nas mangas as fórmulas mágicas que pulverizariam, com denúncias e comparações, toda a possibilidade de Lula fazer seu sucessor. Não se pode tratar assim uma força política da dimensão do PT. Goste-se ou não, o adversário tem força, tem peso, tem armas. Minimizar o potencial eleitoral do outro é um passo para a própria destruição.
E não é que isso aconteceu também com a própria candidatura vencedora? A um mês da eleição, pesquisas indicavam uma diferença gigantesca de Dilma em relação a Serra, advinda de um crescimento assombrosamente rápido. Muitos acharam que o jogo tinha acabado. Eu conversava com petistas de carteirinha e outros menos exaltados, e a sensação geral era de que a rejeição de Serra e a percepção popular de Dilma como continuidade de Lula haviam estabelecido um quadro praticamente irreversível. E foi então que Serra reagiu. Mudou seu programa na TV, parou de tentar associar-se a Lula, partiu para ataques mais inflamados e, principalmente, arquitetou uma subcampanha de bastidores das mais baixas já presenciadas, mas das mais eficientes, sem dúvida. Os marqueteiros de Dilma não deram bola; li recentemente uma entrevista com João Santana, inteligência maior da campanha, em que ele revelava que acreditou na vitória em primeiro turno até o dia da apuração*. O PT tomou um susto com o resultado das urnas, e quase que não reage a tempo diante da chacoalhada. Serra tinha muitos problemas como figura pública de presidenciável, mas menosprezá-lo, duvidar de seu potencial e, sobretudo, não se preparar para um desespero-vale-tudo na reta final por parte dele foi ingênuo demais por parte da campanha de Dilma.
Menosprezar o adversário nunca é bom negócio, porque as forças políticas que se apresentam numa campanha têm história, têm ideias, têm simpatizantes, têm espaço conquistado na democracia. Como diria Luxemburgo: "não tem time bobo mais, não!".
* Justiça seja feita. Rodrigo Vianna e Renato Rovai, blogueiros pró-Dilma, tinham visões sensatas e sabiam dos perigos do otimismo desenfreado de antes do primeiro turno.
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