domingo, 23 de março de 2008

Rato chupando manga


Estávamos na Sala de Leitura e víamos o excelente filme da Discovery, Nefertiti revelada. Era uma noite de quarta-feira e a sala fica no segundo andar do prédio da escola, sendo que suas janelas estão voltadas para o pequeno espaço de terra cultivável do estabelecimento, constituído de algumas árvores e muitos arvoredos.
A certa altura, um aluno chamou minha atenção para um movimento estranho vindo de uma árvore. Ele constatara que era um rato comendo uma manga madura.
Nunca tinha visto aquilo. Achei a cena extremamente inusitada. A certa altura, parei a exibição do filme e chamei todo mundo para ver. Como o rato subira ali, ninguém sabia. Mas que era incrível, todos concordavam.
Tirei uma foto que ficou simplesmente horrorosa, escura e tosca. Mas é a única prova do fato. observando com muita paciência, dá para identificar o bochinho, pelo menos os contornos.
Às vezes, a natureza nos proporciona espetáculos (ainda que bizarros) que valem a perda de uma parte da aula. Adiante, isso se reverte em ganho, tenho certeza.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Educação - casos verídicos 2: Os 907 livros

Reclamei com a coordenadora pedagógica. Eu não podia distribuir os livros didáticos de 8a. série para os alunos, nem os de 7a. Faltavam livros. Alguns ficariam sem. E pior: se um aluno se matriculasse no meio do ano, fato comum na nossa escola, ficaria sem livro.
Reclamara isso logo na primeira semana. Já era passado mais de um mês de aula quando cansaram da minha insistência e resolveram me responder. A primeira resposta foi: não havia mais exemplares do título escolhido na reserva técnica. (Equivale a dizer que nos estoques da Prefeitura, não tinha mais daquele título, nenhum exemplar).
Devolvi com minha indignação de sempre, e questionei a quantidade enviada. São os professores que escolhem o título e determinam o número de exemplares, de acordo com a expectativa de formação das classes. A Prefeitura simplesmente confirma (ou não) a compra e envia o material. Para mim, nenhum professor com funções cerebrais normais pediria uma quantidade de livros incapaz de atender a demanda. Sendo assim, se a compra havia sido feita e sabíamos disso, onde estavam os livros?
Segunda resposta que chegou: muitos livros ainda estavam no correio.
Não gostei da resposta e pedi para ver a planilha de entrega dos títulos. De fato, estão no correio até agora. Somando todas as disciplinas que estão com problemas equivalentes, são 907 livros.

Peço atenção para o número: 907 livros didáticos estão no correio. Por algum motivo não foram entregues nem antes das aulas nem nas primeiras semanas. Estamos com um mês e pouco de aula e 907 livros destinados aos alunos da EMEF Dona Chiquinha Rodrigues continuam no correio. Repito: 907 livros ainda estão no correio depois de um mês e pouco de iniciadas as aulas.

907 livros. Só acredito porque vi escrito.

domingo, 9 de março de 2008

A voz mecânica

Hoje entrávamos no Shopping Ibirapuera, e quando passamos pela catraca para pegar o ticket do estacionamento, o rapaz que nos entregou conversava interessadamente com uma moça a seu lado. Enquanto ele, sem sequer nos fitar, estendia o braço e entregava o ticket, ouvíamos uma voz mecânica dizer: "Obrigado por sua visita ao Shopping Ibirapuera".
Na Reunião de Professores deste ano, na escola em que trabalho, a coordenadora comentou alguns assuntos, assuntou outras coisas e fez as recomendações necessárias no meio de uma falação geral. Quando um colega levantava a mão para expor algum item importante, os outros simplesmente ignoravam a colocação, continuando ou iniciando uma conversa paralela. Não dava pra ouvir ninguém. Até que chegou o momento de passar o vídeo com a fala do secretário da educação.
A coordenadora nos advertiu de que era improtante, de que tínhamos de fazer silêncio. Nós advertimos nossos colegas de que era preciso maneirar para ouvir o vídeo. Botei o vídeo para rodar. O murmurinho acabou, a falação cessou, todos prestaram atenção. A imagem do secretário no vídeo impôs mais respeito que a fala de qualquer dos colegas que estava presente. Respeitamos mais a fita de vídeo que o companheiro de profissão sentado ao nosso lado.
Refleti sobre isso hoje. Em um caso, a voz mecânica foi mais educada que a pessoa de carne e osso. No outro caso, as pessoas foram mais educadas com a voz gravada que com as pessoas de carne e osso. Nos dois casos, a pasteurização da fala e a impossibilidade de diálogo mostraram-se menos incômodas que as possibilidades de trocas erigidas na relação interpessoal. As pessoas não querem conversar, parece que isso incomoda. E parece que isso já foi descoberto por quem as manipula.

sábado, 1 de março de 2008

Sapato sob medida

Há alguns meses meu pai me ofereceu um sapato, novinho em folha e muito bom. Eu experimentei e caiu como uma luva no meu pé (luva no pé foi bacana!). Agradeci o presente, mas ficou a dúvida: porque ele não queria um artigo tão bonito e fino como aquele?
Acontece que o velho conhecera um senhor que confeccionava sapatos sob medida. Conversa daqui, conversa dali, resolvera encomendar um par. O sapateiro tirou as medidas do pé do coroa e fez o combinado. Quando meu pai foi buscar o produto, trouxe para casa para experimentar. Constatou, consternado, que o sapato simplesmente não calçava. Não havia encaixe possível com seus pés.
Ora, era possível devolver e ser ressarcido. Mas ele gentilmente lembrou de mim, e como o sapato tinha ficado realmente bonito, bem feito, me ofereceu como presente, desde que me servisse. Adorei a idéia.

Creio ser esta a primeira história conhecida de sapato cientificamente projetado sob medida para uma pessoa e milimetricamente confeccionado sob medida para outra. Torço para que meu pai volte sempre àquele sapateiro.