terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Polaridades

Meu sogro sempre tentou me explicar como funcionava o positivo e o negativo na macrobiótica, mas é difícil de entender. Para mim, o arroz teria de ser ou positivo ou negativo, tal como a cenoura, a batata, o alface, etc. Para equilibrar a alimentação, minha única tarefa seria juntar positivos e negativos no prato.
Pela explicação dele, o equilíbrio não funciona dessa forma, porque os alimentos são positivos e negativos uns em relação aos outros. Ou seja, em um determinado prato, o arroz pode funcionar como positivo ou negativo, dependendo dos outros alimentos que o acompanham. Por esse raciocínio, a polaridade (digamos assim, só pra entender) não está no alimento, mas na posição que ele ocupa na composição da refeição.

Esta peculiaridade da macrobiótica, que não entendo bem, serve-me como analogia do quadro político brasileiro, que igualmente não posso entender. Tudo depende do lado, da composição de forças, do "diga-me com quem andas". É lamentável e impressionante a total ausência de agendas políticas, tanto dos partidos quanto das organizações e movimentos. Ninguém sabe muito bem o que quer e onde quer chegar, mas todo mundo é craque em identificar o adversário e tentar destruí-lo.
Há várias demonstrações disso na rede, e, só para ficar nas mais evidentes, abra-se a página de fórum da comunidade Brasil, do orkut. A quantidade de tópicos criados sobre candidaturas a presidência, governo, prefeitura, ou outros cargos é simplesmente enorme. Isso poderia ser um bom sinal, de maturidade política, de vontade de discutir propostas. No entanto, quando empreendemos nosso tempo na leitura de cada um desses tópicos, o que vemos é um desfile perfis falsos repetindo palavras de ordem e despejando elogios ou vitupérios em relação a determinada personalidade política.
No meio desse tiroteio verbal, perdemos completamente a noção do que se está discutindo, e os que discutem perdem a referência política básica, que é o interesse público. Assim, uma mesma figura fictícia dirá que a resistência contra a ditadura militar pela esquerda organizada era terrorismo, atacando Dilma por ser governista, e elogiará, por exemplo, Gabeira, por ser oposição. Uma outra figura elogiará a política econômica de FHC falando mal da de Lula, mesmo que o assunto seja, por exemplo, uma orientação conservadora, comum a ambas as gestões. Ficamos sempre na dúvida sobre a posição da figura: uma política econômica conservadora é boa para o país ou não? Os ex-combatentes da ditadura são terroristas ou não?
Como resultado, não sabemos com quem estamos falando, e acabamos falando com ninguém, pois não podemos identificar o interlocutor por suas posições. Em outras palavras: não sabemos onde as pessoas querem chegar.
O que acontece na comunidade do orkut apenas reflete o que vemos diariamente na imprensa, nas discussões de populares, nos órgãos dos três poderes, em todos os lugares: uma sanha de atacar e defender tão grande que gera o esquecimento (ou mascaramento, quando conveniente) da essência do que é atacado ou defendido.
O quadro político brasileiro, cindido entre PT e PSDB, apresenta essa características complexas de polarização. CEUs são bons se feitos por X. Se feitos por Y, são caros e eleitoreiros. Privatizar é uma coisa legal, se Fulano está no governo. Se Sicrano está, privatizar não presta.
Falta agenda, falta clareza do que é necessário, falta interesse público, que é suprapratidário por natureza. Deixamos de discutir questões prementes, como o desmatamento da Amazônia, a reforma política do Legislativo ou o combate ao tráfico, simplesmente porque as plataformas dos partidos não se preocupam com o estabelecimento de agendas básicas para resolução desses problemas, a não ser em época de eleição, quando os discursos tornam-se evasivos e demagógicos, incapazes de posicionamentos eficazes e propostas ousadas. No fim, fica tudo como o arroz da macrobiótica: depende do que acompanha, pode ser positivo ou negativo. Se Gabeira está na oposição, é considerado um gênio. Se está com o governo, pode dizer exatamente as mesmas coisas e ser considerado um imbecil.
Enfim, talvez a política seja isso mesmo, mais um jogo de forças que uma luta por ideais ou princípios. Se for assim, serei sempre um inconformado. Mas acho que não. Ainda verei um país em que política seja discutida por verdadeiros apaixonados, e não por torcedores uniformizados.

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